Estamos, pouco a pouco, desmistificando os rótulos dos vários alimentos, compreendendo melhor seus nutrientes.
Sabemos que nem todas as gorduras são deletérias, que nem toda redução de carboidratos é saudável, que o excesso de proteínas faz mal à saúde e que o equilíbrio e a variedade sãos as bases para uma dieta saudável. Mesmo assim, as dietas estão constantemente sendo estudadas e testadas para que possamos orientar os pacientes de forma menos empírica, prescrevendo dietas baseadas em evidências científicas. Atualmente, há uma tendência real entre os estudiosos de Nutrição no sentido de reduzir a proporção dos carboidratos das dietas, em favor de um aumento na proporção das gorduras. Não estamos falando da suspensão dos carboidratos, nem estamos falando de qualquer gordura...
Nosso posicionamento atual é que devemos reduzir entre 10 a 15% dos carboidratos das dietas, em favor do aumento da gordura monoinsaturada, aquela gordura presente no azeite de oliva. Apesar disso, para que possamos ter uma dieta saudável, não basta reduzir o arroz e o pão e adicionar o azeite ao nosso prato. É muito importante reduzir a ingestão de gorduras saturadas. Essa é a parte mais difícil para os brasileiros, acostumados ao churrasco e à feijoada. As outras fontes de gordura saturada, como os laticínios integrais, já podem ser facilmente reduzidas do cardápio, uma vez que leite, requeijão e iogurte desnatados vêm sendo incorporados à dieta, com a vantagem de conterem muito menos gorduras saturadas, de oferecerem o mesmo valor nutricional, como o teor em cálcio, e de serem tão saborosos quanto suas versões integrais.
Com relação aos queijos, ainda não conseguimos tal façanha, uma vez que os queijos magros são bem menos saborosos e ainda contêm alto teor de gordura saturada. Assim, regar a pizza de mussarela com azeite não a deixa mais saudável, apenas mais calórica, pois ela continuará tendo alto teor de gordura saturada devido ao queijo.
O que há de especial no azeite?
As propriedades nutricionais e terapêuticas do azeite vêm sendo demonstradas em vários trabalhos científicos. Há muitas evidências de que esse tipo de gordura pode ter efeitos benéficos na prevenção de doenças cardiovasculares e do câncer, principalmente o azeite não refinado ou virgem. Ele é praticamente isento de gordura saturada e contém, além da típica gordura monoinsaturada, presente em todos os tipos de azeite, altas concentrações de vitamina E, beta caroteno e polifenóis.
Essa associação de compostos parece ser a responsável pela sua atividade antioxidante e antiinflamatória. Entre os óleos de oliva encontrados nos supermercados, aqueles produzidos pela presa direta ou centrifugação são ditos virgem ou extra virgem e se distinguem pelo seu alto conteúdo de polifenóis (150 a 350mg/kg) em comparação aos azeites refinados que, apesar de também serem fontes de gorduras monoinsaturadas, são pobres em polifenóis.
Dieta do Mediterrâneo
A Espanha lançou uma campanha, junto à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), para transformar a Dieta do Mediterrâneo em patrimônio cultural da humanidade. É bem conhecida entre os países europeus a baixa taxa de mortalidade por razões cardiovasculares entre os povos da área do Mediterrâneo - Itália, França, Espanha e Portugal -em relação aos países do norte e do leste europeu. A explicação mais provável para esse fenômeno está relacionada à Dieta Mediterrânea, uma forma de alimentação cuja principal característica é sua riqueza em gordura monoinsaturada.
É importante lembrarmos que a Dieta do Mediterrâneo é muito mais do que uma dieta rica em gordura saudável. Os povos mediterrâneos consomem muitas frutas, cereais e hortaliças, vinho tinto regularmente e uma quantidade muito pequena de gordura saturada, sob a forma de carne vermelha. Assim, fica difícil reconhecermos o real papel do azeite na proteção cardiovascular dessas dietas. O grande benefício das mesmas pode estar na associação de vários alimentos benéficos juntamente com uma drástica redução de alimentos sabidamente deletérios, como a carne vermelha, rica em gordura saturada.
Efeitos benéficos do azeite
Muitos trabalhos científicos têm sido realizados no sentido de avaliar os prováveis efeitos do azeite em nossa saúde, além de ser um ingrediente saboroso em nossos pratos. Dentre estes, dois trabalhos, relativamente recentes e publicados em revistas médicas de grande credibilidade e rigor científico, revelam muito sobre os potenciais benefícios dessa gordura do bem. No primeiro deles, os autores descobriram que a proporção dos nutrientes de uma dieta pode interferir na distribuição da gordura corporal, mesmo sem afetar o peso das pessoas, e que o consumo regular do azeite propiciaria uma redistribuição da gordura no sentido de reduzir seus depósitos abdominais em benefício dos depósitos periféricos.
Isso pode muito bem explicar a proteção cardiovascular da Dieta do Mediterrâneo, uma vez que a obesidade central está claramente relacionada ao infarto agudo do miocárdio e às várias outras formas de doenças do coração. Esses dados foram publicados no Diabetes Care, a revista da Associação Americana de Diabetes. No segundo trabalho, publicado na revista Annals of Internal Medicine, os autores conseguiram comprovar que o conteúdo em polifenóis do azeite está intimamente relacionado ao poder antioxidante dessa gordura e que em sua forma virgem, com altos teores de polifenóis, o azeite consumido regularmente, aumenta os níveis do HDL ou colesterol bom e reduz o dano oxidativo que ocorre ao LDL ou colesterol ruim, tornando-o menos deletério.
Talvez essa característica seja mais um reforço aos grandes benefícios à saúde causados pela Dieta do Mediterrâneo. Assim, o azeite, principalmente o não refinado ou virgem, é dotado de vários componentes potencialmente benéficos à saúde cardiovascular, compreendendo as gorduras monoinsaturadas - os polifenóis - sem deixar de mencionar outro potente antioxidante também presente em abundância em sua composição: a vitamina E.
Além da proteção cardiovascular
Muitas pesquisas têm relacionado o consumo regular do azeite a efeitos bactericidas (sobre o H-pylori nas gastrites), a efeitos analgésicos (em doenças inflamatórias crônicas) e a efeitos preventivos, em casos de fraturas e vários tipos de câncer (como os de cólon e mama). “Estes estudos são preliminares e ainda necessitam de comprovação de sua aplicabilidade clínica, mas já demonstram o grande potencial terapêutico do azeite, além do seu refinado e inconfundível sabor”, destaca a endocrinologista.
Vantagens do azeite extra virgem
O efeito na redistribuição de gordura corporal foi demonstrado com todos os tipos de azeite de oliva, uma vez que a gordura monoinsaturada, responsável por esse efeito, está igualmente presente em todos eles. Já quando se fala em evitar a aterosclerose e prevenir a formação das placas de gordura, que obstruem as artérias, o azeite extra virgem, de longe, é o melhor, pois o efeito na redução da adesão do colesterol às paredes dos vasos sangüíneos é exercido pelos antioxidantes presentes nessa forma não refinada do azeite.
Como e quanto consumir
É aconselhável manter o azeite em recipientes escuros, em locais frescos e longe da incidência de luz, uma vez que o produto pode sofrer oxidação quando exposto em frascos e galeteiros transparentes. Ao consumir o azeite devemos observar a data de validade, como com qualquer outro alimento. Depois de aberto, o produto, desde que conservado longe da luz e bem tampado, deve ser consumido em seis meses, no máximo. Pode ser utilizado à temperatura ambiente, como pode ser aquecido em alimentos cozidos.
Só não vale fritar ou abusar de temperaturas altas, pois quanto maior o calor, maiores as perdas dos seus compostos benéficos. Apesar de tantos benefícios, o azeite é tão calórico quanto à banha de porco. Fornece 9 calorias por grama do produto e pode adicionar muitas calorias ao cardápio de uma pessoa, inviabilizando seus planos de alcançar ou manter um peso ideal. De acordo com as recomendações do FDA (US Food and Drug Administration), a média ideal para um adulto seriam quatro colheres de sopa diariamente, o que fornece 200 calorias diárias.
*Dra. Ellen Simone Paiva é endocrinologista e nutróloga. Diretora clínica do CITEN - Centro Integrado de Terapia Nutricional.
Fonte: Jornal O Debate
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