Grupo de Ribeirão Preto busca saber qual o significado da presença desse vírus emergente encontrado em cerca de metade das crianças com hipertrofia de amígdalas (PDBJ)
Agência FAPESP – Um vírus provavelmente muito antigo na espécie humana, mas descoberto apenas em 2005, tem chamado a atenção de um grupo de pesquisadores da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), da Universidade de São Paulo (USP), especializado em vírus emergentes, como hantavírus, vírus do oeste do Nilo ou Oropouche.
O bocavírus humano – parente distante do vírus causador da parvovirose canina – foi encontrado em cerca de 5% das mais de mil amostras colhidas de crianças internadas ou admitidas no Pronto Socorro do Hospital das Clínicas da FMRP e analisadas pelo Centro de Pesquisa em Virologia da faculdade.
O número se assemelha aos obtidos em outros locais do mundo, incluindo a Suécia, onde o vírus foi descoberto em um estudo de metagenômica que investigou amostras respiratórias de pessoas com infecções respiratórias com resultados laboratoriais negativos para vírus convencionais.
“O bocavírus humano é da família de um vírus humano já conhecido, o parvovírus B-19, e do bocavírus canino, que causa a parvovirose canina. Nunca antes de 2005 havia sido detectado um bocavírus humano”, disse o professor Eurico de Arruda Neto, um dos pesquisadores principais de um Projeto Temático financiado pela FAPESP sobre o assunto.
De acordo com Arruda Neto, apesar de os parvovírus estarem há muito tempo entre a espécie humana, os bocavírus são considerados emergentes porque foram descobertos recentemente. Em geral, o bocavírus causa infecção respiratória branda, mas pode também provocar bronquiolite em crianças muito pequenas.
Como parte do Projeto Temático, os pesquisadores buscaram saber se as crianças que estavam infectadas tinham o bocavírus detectado por causa de uma infecção persistente ou se havia uma infecção aguda no momento da consulta.
“Desenvolvemos um método no qual, em vez de procurar o DNA do vírus, procuramos o RNA mensageiro para proteínas do capsídeo, cuja presença é um marcador de replicação”, disse Arruda Neto. De acordo com ele, se está sendo produzido RNA mensageiro para a proteína estrutural é porque o vírus está replicando. Em outras palavras, há uma infecção aguda.
“Feito esse teste, descobrimos que apenas 25% dos pacientes positivos para o DNA desse vírus têm RNA mensageiro. Ou seja, aproximadamente um quarto das crianças com bocavírus está de fato na fase aguda de infecção por esse agente. As outras provavelmente o têm de forma persistente, consequência de infecções passadas”, disse.
Os pesquisadores também verificaram que o bocavírus quase nunca está sozinho, e há uma taxa “altíssima” de coinfecções. “Achamos vários vírus nessas amostras, não somente um ou dois, mas muitas vezes quatro ou cinco agentes diferentes. Estamos investigando muito intensamente no laboratório qual a importância dessas coinfecções”, disse Arruda Neto.
Se apenas um quarto dos 5% das crianças com o vírus apresentou infecção aguda, a porcentagem de infectados aumentou quando foram feitas análises do tecido de amígdalas e adenoides retiradas de crianças por motivos de hipertrofia amigdaliana. Nesses casos, o número de infectados pelo bocavírus ultrapassou a metade das amostras, intrigando os pesquisadores.
“O que eles [os bocavírus] estão fazendo em amígdalas e adenoides? A criança não tem sintoma de infecção aguda, não está espirrando, não está tossindo. O tecido foi removido porque estava hipertrofiado. E aí encontramos o vírus no interior daquele tecido da amígdala”, afirmou Arruda Neto.
“O que isso significa? A presença do vírus é benéfica ou maléfica? Está relacionada à hipertrofia das amígdalas apresentada por tantas crianças? Ainda não temos respostas a essas questões, que estão sendo investigadas em outro Projeto Temático da FAPESP do qual fazemos parte, coordenado pela professora Wilma Terezinha Anselmo Lima, da Otorrinolaringologia da FMRP-USP”, disse Arruda Neto.
Ancestralidade
O grupo de Ribeirão Preto fez o sequenciamento de genomas completos de bocavírus de 20 pacientes, que apresentaram muito pouca variabilidade. “O interessante é que, apesar de a infecção pelo bocavírus raramente ser grave, ela é persistente. Há relatos de outros pesquisadores mostrando que há fragmentos de DNA de parvovírus incorporados ao genoma humano há milhares de anos”, disse Arruda Neto.
“Exatamente o que representam em termos de casos de doença atualmente e o que significa achá-los na garganta de uma criança é o que estamos investigando agora”, disse.
O artigo com os dados do estudo coordenado por Arruda Neto com as crianças de Ribeirão Preto foi publicado na revista PLoS One e pode ser lido em: www.plosone.org/article/info:doi/10.1371/journal.pone.0021083
fonte:http://agencia.fapesp.br/17286
Por Frances Jones
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