Prevalência tardia
9/3/2009
Por Thiago Romero
Agência FAPESP – Em consonância com os números indicados por estudos internacionais – principalmente feitos nos Estados Unidos e na Europa – a idade média para o diagnóstico de câncer de mama no Brasil está em 59,3 anos.
Essa é uma das principais conclusões do Projeto Amazona, desenvolvido pelo Grupo Brasileiro de Estudos de Câncer Mama (Gbecam) e cujos resultados foram apresentados com exclusividade a médicos e jornalistas durante a terceira edição da Conferência Brasileira de Câncer de Mama, nos dias 6 e 7 de março, na capital paulista.
O projeto se caracterizou pela coleta de dados epidemiológicos, de diagnóstico, de tratamento e de sobrevida de 4.912 mulheres com câncer de mama – amostra que constitui aproximadamente 5% das brasileiras diagnosticadas com câncer de mama no período do estudo, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca).
“Tínhamos muitas dúvidas sobre a idade média de diagnóstico. Até então, a impressão geral da comunidade nacional de oncologistas era a de que o diagnóstico inicial da doença ocorria bem mais cedo, o que nos levava a crer que o câncer de mama no país era uma doença jovem”, disse Sergio Daniel Simon, coordenador do estudo e presidente do Gbecam, à Agência FAPESP.
“Mas apenas 25% das pacientes estudadas tinham menos de 50 anos. Essas informações são inéditas e inesperadas pela própria comunidade médica nacional”, complementa o também professor de oncologia clínica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
O estudo foi realizado em 28 instituições de saúde de todo o país, entre clínicas e hospitais públicos e privados. Os pesquisadores analisaram casos da doença registrados nas instituições participantes em 2001 (2.198 casos) e em 2006 (2.714 casos) para, com isso, poder identificar variáveis como novas causas, atendimento oferecido e sobrevida.
O objetivo central do Projeto Amazona, cujo nome é uma homenagem às mulheres brasileiras portadoras de câncer de mama, é aumentar o conhecimento da comunidade médica sobre a doença entre a população, de modo que os dados sejam usados para mapear seu tratamento e diagnóstico.
Para isso, o levantamento incluiu o perfil das pacientes tratadas, reunindo informações sobre idade, raça, gestações e histórico familiar de câncer e o perfil dos tumores encontrados – tipos de tumor, estágio e características biológicas –, além do tipo de tratamento recebido pelas pacientes, tais como cirurgia, radioterapia ou quimioterapia.
Foram analisadas pacientes em serviços de saúde nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Pará, Ceará, Rio Grande do Norte, Sergipe, Bahia, Paraná, Goiás, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Tumores agressivos
Segundo Simon, um dado importante revelado pelo estudo diz respeito ao tipo de tumor de mama mais frequente, o carcinoma ductal invasivo, presente em 70% dos casos. “Desses, 23% dos tumores eram de grau 3, que são os mais agressivos, 63% de grau 2 e 14% de grau 1, os menos agressivos.”
Uma hipótese inicial do estudo, que apontava para a existência de diferenças raciais nos tumores de mama, foi demonstrada no trabalho. “Nas pacientes negras e mulatas os tumores de mama de grau 3 foram significativamente mais comuns do que nas mulheres brancas, associação que também está de acordo com as experiências norte-americanas. Lá, as negras também sofrem com tipos de cânceres mais agressivos”, disse.
“Acredita-se que as brasileiras tenham um padrão de câncer de mama semelhante ao que ocorre na África, onde a maioria também sofre com tumores agressivos. No Brasil, constatamos que aproximadamente 35% das mulheres negras com câncer têm tumores de alto grau”, disse Simon.
Cerca de 20% das brasileiras, ainda de acordo com o levantamento do Gbecam, têm um dos tipos de tumores de mama mais agressivos segundo a literatura científica, conhecido como HER-2 positivo, que se expressa na superfície das células de mama.
“Um dado preocupante é que o câncer na mama localizado foi verificado em 31% das pacientes examinadas, enquanto a doença avançada na mama atingiu cerca de 60%. Nos Estados Unidos esse número é o oposto, ou seja, 60% das pacientes têm a doença localizada e só 30% têm a mais avançada. Isso leva a concluir que o diagnóstico de câncer de mama no Brasil tem sido feito muito tardiamente”, apontou.
Diagnóstico em baixa
Simon lamenta também a pouca frequência de diagnóstico de carcinoma in situ, tipo de câncer de mama altamente curável quando identificado em fases precoces, chegando a mais de 90% de cura nesse estágio.
“O carcinoma in situ normalmente é diagnosticado por mamografia e, nas pacientes do estudo, sua presença girou em torno de apenas 5%, enquanto nos Estados Unidos essa taxa é de mais de 35%. Isso porque os americanos têm bons programas de incentivo à mamografia que conseguem detectar a doença em um grande número de mulheres, o que infelizmente não ocorre em nosso país. Estamos muito mal em termos de diagnóstico de carcinoma in situ no Brasil”, disse.
O estudo também aponta que 18% das pacientes analisadas têm histórico familiar de câncer de mama (mãe, irmã ou filha) de primeiro grau, o que também está de acordo com as estatísticas mundiais, que giram em torno de 15%.
“Além disso, 2,3% das pacientes tinham histórico familiar de câncer de ovário também de primeiro grau, batendo com os números mundiais, que estão entre 2 e 3% nesse tipo de tumor”, conta.
O levantamento aponta ainda dados de cura e sobrevida das mulheres ao longo dos anos. “Constatamos uma pior sobrevida na amostragem de pacientes tratadas em serviços públicos no Brasil, nos quais as pacientes, muitas vezes, não têm acesso ao tratamento completo de combate ao câncer. Umas das hipóteses é que elas chegam ao serviço público com a doença em estágios mais avançada, quando as chances de cura são menores”, disse Simon.
Os pesquisadores responsáveis pelo estudo estudam a possibilidade de disponibilizar em breve um documento com os resultados detalhados do Projeto Amazona, incluindo gráficos e tabelas, na página do Gbecam.
“Nossa expectativa é que esses dados inéditos, que compõem um panorama bem abrangente e atual do câncer de mama no Brasil, possam não apenas nortear os próximos estudos do Gbecam e de outros institutos de ensino e pesquisa como também servir de base para a elaboração de políticas públicas na área”, disse o professor da Unifesp.
9/3/2009
Por Thiago Romero
Agência FAPESP – Em consonância com os números indicados por estudos internacionais – principalmente feitos nos Estados Unidos e na Europa – a idade média para o diagnóstico de câncer de mama no Brasil está em 59,3 anos.
Essa é uma das principais conclusões do Projeto Amazona, desenvolvido pelo Grupo Brasileiro de Estudos de Câncer Mama (Gbecam) e cujos resultados foram apresentados com exclusividade a médicos e jornalistas durante a terceira edição da Conferência Brasileira de Câncer de Mama, nos dias 6 e 7 de março, na capital paulista.
O projeto se caracterizou pela coleta de dados epidemiológicos, de diagnóstico, de tratamento e de sobrevida de 4.912 mulheres com câncer de mama – amostra que constitui aproximadamente 5% das brasileiras diagnosticadas com câncer de mama no período do estudo, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca).
“Tínhamos muitas dúvidas sobre a idade média de diagnóstico. Até então, a impressão geral da comunidade nacional de oncologistas era a de que o diagnóstico inicial da doença ocorria bem mais cedo, o que nos levava a crer que o câncer de mama no país era uma doença jovem”, disse Sergio Daniel Simon, coordenador do estudo e presidente do Gbecam, à Agência FAPESP.
“Mas apenas 25% das pacientes estudadas tinham menos de 50 anos. Essas informações são inéditas e inesperadas pela própria comunidade médica nacional”, complementa o também professor de oncologia clínica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
O estudo foi realizado em 28 instituições de saúde de todo o país, entre clínicas e hospitais públicos e privados. Os pesquisadores analisaram casos da doença registrados nas instituições participantes em 2001 (2.198 casos) e em 2006 (2.714 casos) para, com isso, poder identificar variáveis como novas causas, atendimento oferecido e sobrevida.
O objetivo central do Projeto Amazona, cujo nome é uma homenagem às mulheres brasileiras portadoras de câncer de mama, é aumentar o conhecimento da comunidade médica sobre a doença entre a população, de modo que os dados sejam usados para mapear seu tratamento e diagnóstico.
Para isso, o levantamento incluiu o perfil das pacientes tratadas, reunindo informações sobre idade, raça, gestações e histórico familiar de câncer e o perfil dos tumores encontrados – tipos de tumor, estágio e características biológicas –, além do tipo de tratamento recebido pelas pacientes, tais como cirurgia, radioterapia ou quimioterapia.
Foram analisadas pacientes em serviços de saúde nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Pará, Ceará, Rio Grande do Norte, Sergipe, Bahia, Paraná, Goiás, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Tumores agressivos
Segundo Simon, um dado importante revelado pelo estudo diz respeito ao tipo de tumor de mama mais frequente, o carcinoma ductal invasivo, presente em 70% dos casos. “Desses, 23% dos tumores eram de grau 3, que são os mais agressivos, 63% de grau 2 e 14% de grau 1, os menos agressivos.”
Uma hipótese inicial do estudo, que apontava para a existência de diferenças raciais nos tumores de mama, foi demonstrada no trabalho. “Nas pacientes negras e mulatas os tumores de mama de grau 3 foram significativamente mais comuns do que nas mulheres brancas, associação que também está de acordo com as experiências norte-americanas. Lá, as negras também sofrem com tipos de cânceres mais agressivos”, disse.
“Acredita-se que as brasileiras tenham um padrão de câncer de mama semelhante ao que ocorre na África, onde a maioria também sofre com tumores agressivos. No Brasil, constatamos que aproximadamente 35% das mulheres negras com câncer têm tumores de alto grau”, disse Simon.
Cerca de 20% das brasileiras, ainda de acordo com o levantamento do Gbecam, têm um dos tipos de tumores de mama mais agressivos segundo a literatura científica, conhecido como HER-2 positivo, que se expressa na superfície das células de mama.
“Um dado preocupante é que o câncer na mama localizado foi verificado em 31% das pacientes examinadas, enquanto a doença avançada na mama atingiu cerca de 60%. Nos Estados Unidos esse número é o oposto, ou seja, 60% das pacientes têm a doença localizada e só 30% têm a mais avançada. Isso leva a concluir que o diagnóstico de câncer de mama no Brasil tem sido feito muito tardiamente”, apontou.
Diagnóstico em baixa
Simon lamenta também a pouca frequência de diagnóstico de carcinoma in situ, tipo de câncer de mama altamente curável quando identificado em fases precoces, chegando a mais de 90% de cura nesse estágio.
“O carcinoma in situ normalmente é diagnosticado por mamografia e, nas pacientes do estudo, sua presença girou em torno de apenas 5%, enquanto nos Estados Unidos essa taxa é de mais de 35%. Isso porque os americanos têm bons programas de incentivo à mamografia que conseguem detectar a doença em um grande número de mulheres, o que infelizmente não ocorre em nosso país. Estamos muito mal em termos de diagnóstico de carcinoma in situ no Brasil”, disse.
O estudo também aponta que 18% das pacientes analisadas têm histórico familiar de câncer de mama (mãe, irmã ou filha) de primeiro grau, o que também está de acordo com as estatísticas mundiais, que giram em torno de 15%.
“Além disso, 2,3% das pacientes tinham histórico familiar de câncer de ovário também de primeiro grau, batendo com os números mundiais, que estão entre 2 e 3% nesse tipo de tumor”, conta.
O levantamento aponta ainda dados de cura e sobrevida das mulheres ao longo dos anos. “Constatamos uma pior sobrevida na amostragem de pacientes tratadas em serviços públicos no Brasil, nos quais as pacientes, muitas vezes, não têm acesso ao tratamento completo de combate ao câncer. Umas das hipóteses é que elas chegam ao serviço público com a doença em estágios mais avançada, quando as chances de cura são menores”, disse Simon.
Os pesquisadores responsáveis pelo estudo estudam a possibilidade de disponibilizar em breve um documento com os resultados detalhados do Projeto Amazona, incluindo gráficos e tabelas, na página do Gbecam.
“Nossa expectativa é que esses dados inéditos, que compõem um panorama bem abrangente e atual do câncer de mama no Brasil, possam não apenas nortear os próximos estudos do Gbecam e de outros institutos de ensino e pesquisa como também servir de base para a elaboração de políticas públicas na área”, disse o professor da Unifesp.
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