EDUARDO GERAQUE
Da Folha de S.Paulo
Com a anuência do Supremo Tribunal Federal, o Brasil pode agora, enfim, "apostar" nos estudos com células-tronco embrionárias. Essa é perspectiva para grupos de pesquisa nacionais de biologia molecular, diz o neurocientista Stevens Rehen, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Ele é um dos dois pesquisadores que tentam, dentro do país, cultivar células-tronco retiradas de embriões humanos.
Não há certeza ainda, porém, de que elas renderão novas terapias. "É uma aposta, mas uma aposta fundamentada. E pode ser que todo mundo dê com os burros n'água daqui a alguns anos", disse o pesquisador à Folha. De acordo com Rehen, depois de o Supremo ter validado a Lei de Biossegurança, o que vem agora chega até a "assustar", por ser muito novo.
"Mas a ciência avança assim. Que bom que podemos apostar nisso. O Brasil sempre fica a reboque, como ocorreu com o Projeto Genoma, quando entramos tarde no processo", diz o cientista, que calcula que o Brasil terá sua linhagem de células próprias em até dois anos.
O fato de as pesquisas com células embrionárias estarem liberadas para embriões congelados antes de 2005 traz um certo alívio, mas está muito longe de resolver o problema. Segundo o cientista carioca, esse material congelado há alguns anos, "falando friamente", não é o ideal. "Não quer dizer que seja impossível [retirar as células desses embriões], mas o desafio passa a ser maior".
Além das complicações intramuros na bancada dos laboratórios, diz Rehen, no campo político o Brasil tem de escolher um modelo estratégico que não desperdice recursos financeiros para gerar os insumos de pesquisa necessários.
"Não precisamos de 50 laboratórios no Brasil produzindo células-tronco embrionárias. Se tivermos um ou dois que gerem linhagens celulares suficientes para pesquisadores de qualquer parte do Brasil está bom", afirma. "Não dá para querer gerar um cultura de célula em cada esquina."
Em paralelo à ação orquestrada do governo, o neurocientista da UFRJ também defende uma postura diferente da própria comunidade científica.
Gente em falta
Para Rehen, os cientistas brasileiros precisam colaborar mais. "Não tem de ter sonegação de informação científica. É o momento de abrirmos as portas do laboratório para que mais pessoas possam trabalhar. Se não houver um esforço coletivo, nada vai avançar", diz.
O número relativamente reduzido de cientistas atualmente no Brasil, apesar de muitos dos biólogos serem bem qualificados, é outro gargalo que precisa ser resolvido, diz o neurocientista. Rehen trabalha especificamente tentando fazer com que o material celular embrionário possa ser diferenciado em neurônios. As células dele vieram dos EUA.
"O mais importante agora, também, é formar mais gente. Nem adianta fazer como a Califórnia, investir até US$ 3 bilhões em projetos de pesquisa, porque não teremos grupos para usar todos esses recursos".
Segundo Rehen, os R$ 21 milhões anunciados pelo governo federal para todos os estudos com células-tronco, inclusive as adultas, é razoável. "A idéia do trabalho em rede é boa porque permite investir com profissionalismo", diz.
Mesmo ainda sem muitos grupos envolvidos diretamente com as células-tronco embrionárias --projetos de ponta existem em locais como a UFRJ, USP (Universidade de São Paulo), Unesp (Universidade Estadual Paulista) e UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)- o Brasil, segundo Rehen, não pode ser rotulado como atrasado. "Principalmente se formos comparar com todo o hemisfério Sul, com exceção da Austrália", diz.
O atraso em relação aos EUA e a alguns países da Europa, como a Inglaterra, é histórico, afirma o pesquisador.
No Reino Unido, por exemplo, a discussão nos tribunais também está mais avançada. A Corte, lá, acaba de liberar o uso de embriões híbridos, que têm material humano e de vaca. "Aqui nós estamos discutindo coisas anteriores ainda", diz Rehen, que já antecipa uma dor de cabeça legal que pode surgir no futuro para os ministros do STF resolverem.
"Imagine se nessas pesquisas com células reprogramáveis um material de pele se transformar em um espermatozóide. Será possível gerar um filho sem que o pai saiba, ou seja, a partir da pele de alguém."
No caso brasileiro, Rehen não tem dúvida de que o componente religioso e conservador surgiu nos debates do STF pois no imaginário coletivo existe uma ligação entre as células-tronco e o aborto. "Diretamente, não tem nada a ver."
Para resolver isso, diz o cientista da UFRJ, a solução é aumentar a cultura científica da população. "É mais uma questão de formação básica mesmo, que precisa melhorar."
Com a anuência do Supremo Tribunal Federal, o Brasil pode agora, enfim, "apostar" nos estudos com células-tronco embrionárias. Essa é perspectiva para grupos de pesquisa nacionais de biologia molecular, diz o neurocientista Stevens Rehen, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Ele é um dos dois pesquisadores que tentam, dentro do país, cultivar células-tronco retiradas de embriões humanos.
Não há certeza ainda, porém, de que elas renderão novas terapias. "É uma aposta, mas uma aposta fundamentada. E pode ser que todo mundo dê com os burros n'água daqui a alguns anos", disse o pesquisador à Folha. De acordo com Rehen, depois de o Supremo ter validado a Lei de Biossegurança, o que vem agora chega até a "assustar", por ser muito novo.
"Mas a ciência avança assim. Que bom que podemos apostar nisso. O Brasil sempre fica a reboque, como ocorreu com o Projeto Genoma, quando entramos tarde no processo", diz o cientista, que calcula que o Brasil terá sua linhagem de células próprias em até dois anos.
O fato de as pesquisas com células embrionárias estarem liberadas para embriões congelados antes de 2005 traz um certo alívio, mas está muito longe de resolver o problema. Segundo o cientista carioca, esse material congelado há alguns anos, "falando friamente", não é o ideal. "Não quer dizer que seja impossível [retirar as células desses embriões], mas o desafio passa a ser maior".
Além das complicações intramuros na bancada dos laboratórios, diz Rehen, no campo político o Brasil tem de escolher um modelo estratégico que não desperdice recursos financeiros para gerar os insumos de pesquisa necessários.
"Não precisamos de 50 laboratórios no Brasil produzindo células-tronco embrionárias. Se tivermos um ou dois que gerem linhagens celulares suficientes para pesquisadores de qualquer parte do Brasil está bom", afirma. "Não dá para querer gerar um cultura de célula em cada esquina."
Em paralelo à ação orquestrada do governo, o neurocientista da UFRJ também defende uma postura diferente da própria comunidade científica.
Gente em falta
Para Rehen, os cientistas brasileiros precisam colaborar mais. "Não tem de ter sonegação de informação científica. É o momento de abrirmos as portas do laboratório para que mais pessoas possam trabalhar. Se não houver um esforço coletivo, nada vai avançar", diz.
O número relativamente reduzido de cientistas atualmente no Brasil, apesar de muitos dos biólogos serem bem qualificados, é outro gargalo que precisa ser resolvido, diz o neurocientista. Rehen trabalha especificamente tentando fazer com que o material celular embrionário possa ser diferenciado em neurônios. As células dele vieram dos EUA.
"O mais importante agora, também, é formar mais gente. Nem adianta fazer como a Califórnia, investir até US$ 3 bilhões em projetos de pesquisa, porque não teremos grupos para usar todos esses recursos".
Segundo Rehen, os R$ 21 milhões anunciados pelo governo federal para todos os estudos com células-tronco, inclusive as adultas, é razoável. "A idéia do trabalho em rede é boa porque permite investir com profissionalismo", diz.
Mesmo ainda sem muitos grupos envolvidos diretamente com as células-tronco embrionárias --projetos de ponta existem em locais como a UFRJ, USP (Universidade de São Paulo), Unesp (Universidade Estadual Paulista) e UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)- o Brasil, segundo Rehen, não pode ser rotulado como atrasado. "Principalmente se formos comparar com todo o hemisfério Sul, com exceção da Austrália", diz.
O atraso em relação aos EUA e a alguns países da Europa, como a Inglaterra, é histórico, afirma o pesquisador.
No Reino Unido, por exemplo, a discussão nos tribunais também está mais avançada. A Corte, lá, acaba de liberar o uso de embriões híbridos, que têm material humano e de vaca. "Aqui nós estamos discutindo coisas anteriores ainda", diz Rehen, que já antecipa uma dor de cabeça legal que pode surgir no futuro para os ministros do STF resolverem.
"Imagine se nessas pesquisas com células reprogramáveis um material de pele se transformar em um espermatozóide. Será possível gerar um filho sem que o pai saiba, ou seja, a partir da pele de alguém."
No caso brasileiro, Rehen não tem dúvida de que o componente religioso e conservador surgiu nos debates do STF pois no imaginário coletivo existe uma ligação entre as células-tronco e o aborto. "Diretamente, não tem nada a ver."
Para resolver isso, diz o cientista da UFRJ, a solução é aumentar a cultura científica da população. "É mais uma questão de formação básica mesmo, que precisa melhorar."
Nenhum comentário:
Postar um comentário