Os alimentos sem agrotóxicos viram moda ao vender a idéia de que são mais saudáveis
Rosana Zakabi
Fabiano Accorsi |
A refeição orgânica: nem o preço mais elevado assusta os consumidores |
Modismos alimentares que prometem mais saúde costumam entrar e sair de moda no ritmo das estações do ano. A carne vermelha, a margarina e o chocolate são apenas três exemplos de alimentos que se alternam entre os papéis de herói e de vilão nos cardápios. O atual fenômeno no campo das dietas saudáveis prega uma idéia diferente: todos os alimentos fazem bem desde que sejam cultivados sem agrotóxicos, hormônios de crescimento, conservantes ou fertilizantes químicos. Se produzidos de acordo com tais preceitos, são chamados de orgânicos. Há menos de uma década, essa expressão evocava pequenas hortas nas quais se cultivavam legumes e verduras meio ao estilo hippie. Hoje, os produtos orgânicos atraem cada vez mais consumidores e já alcançam um peso significativo no setor agrícola de muitos países. No Brasil, desde 2000 o mercado de alimentos orgânicos cresce à razão de 50% ao ano. A previsão é que em 2005 fature 300 milhões de dólares, um naco que representa 0,5% do faturamento da indústria de alimentos no país. Na maior rede de supermercados brasileira, os orgânicos já representam 8% de todos os alimentos comercializados.
Embora legumes, verduras e frutas sejam os alimentos orgânicos mais consumidos, as carnes bovina e de frango, além dos ovos, hoje também podem fazer parte dessa categoria. Para que a carne seja considerada orgânica, o gado não recebe medicamentos veterinários, à exceção das vacinas. Para combater doenças, os animais são tratados com remédios veterinários homeopáticos. O frango orgânico não pode receber ração com hormônio de crescimento, prática corrente nas granjas convencionais para que as aves se desenvolvam mais rapidamente. Outros produtos facilmente encontrados em versão orgânica são o mel, a soja, o café, o açúcar, o cacau e as castanhas. No caso do mel, o apiário deve estar localizado numa região em que as abelhas só consigam recolher néctar e pólen em flores de áreas livres de agrotóxicos ou lixões. O açúcar não passa pelo refino industrial e, por isso, não contém os aditivos químicos usados nesse processo. Para ser considerado orgânico, o produto precisa ganhar um selo de qualidade emitido por alguma das entidades que monitoram a produção desses alimentos no Brasil, como a Associação de Agricultura Orgânica e o Instituto Biodinâmico, ambos de São Paulo. Alimentos transgênicos, como seria de esperar, estão banidos do receituário orgânico.
Mas, afinal, os alimentos orgânicos são mais saudáveis do que os convencionais? "O valor nutricional é exatamente o mesmo", informa a nutricionista Anita Sachs, da Universidade Federal de São Paulo. Quanto aos agrotóxicos, não há evidência científica de que façam mal para a saúde quando ingeridos com os alimentos. Apenas trabalhadores rurais expostos continuamente a herbicidas, fungicidas e inseticidas por meio da pulverização desses produtos podem sofrer conseqüências como dores de cabeça, náuseas e, segundo alguns estudos americanos, doenças neurológicas e câncer. "A quantidade de agrotóxicos consumida diariamente nos alimentos é ínfima, não tem nenhum efeito sobre o organismo", diz o médico Ângelo Zanaga Trapé, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Muitos entusiastas dos alimentos orgânicos garantem que eles são mais saborosos – mas, evidentemente, gosto não se discute.
O apelo dos alimentos orgânicos é sobretudo psicológico. Numa associação imaginativa de causa e efeito, algumas pessoas cultivam a noção de que, por serem livres de aditivos químicos, esses alimentos deveriam fazer bem à saúde. Segundo uma pesquisa recente do Instituto Ipsos, 14% dos brasileiros que vivem nas grandes cidades consomem algum tipo de produto orgânico e o fazem por causa da imagem de pureza que esses alimentos transmitem. Esses consumidores acreditam que, ao incluir mais orgânicos nas refeições diárias, diminuirão o risco de doenças como hipertensão e infarto. Muitas pessoas também estão convencidas de que, ao consumir orgânicos, praticam uma boa ação. "Para muita gente, essa é uma forma de contribuir para a preservação da biodiversidade, já que os produtos orgânicos são produzidos sem agressões ao meio ambiente", diz Rogério Pereira Dias, coordenador-geral de desenvolvimento sustentável do Ministério da Agricultura.
Os alimentos orgânicos custam bem mais do que os convencionais. Sem os fertilizantes sintéticos que estimulam o crescimento acelerado das plantas, o rendimento da lavoura orgânica é baixo. O preço não chega a intimidar os consumidores dos alimentos orgânicos. "Nossos clientes estão cada vez mais preocupados com a saúde e com a longevidade, por isso o consumo de orgânicos, assim como o de produtos light e diet, não pára de crescer", diz Sandra Caires Saboia, gerente de compras da rede de supermercados Pão de Açúcar, na qual a venda de orgânicos quintuplicou nos últimos quatro anos. Nos Estados Unidos, os supermercados também abrem cada vez mais espaço para os orgânicos. Na rede Wal-Mart, a maior do país, eles já representam 10% dos produtos alimentícios vendidos nas lojas – em 1999, representavam apenas 1%. Até o McDonald's se rendeu aos orgânicos. Seus restaurantes nos Estados Unidos há pouco começaram a vender cafés orgânicos da empresa Newman's Own Organics, da filha do ator Paul Newman. Se o produto fizer sucesso, em breve será oferecido em outras lojas da rede. Isso, é claro, até o próximo modismo alimentar se espalhar pelo mundo e ninguém mais se lembrar dos produtos orgânicos.
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O TOMATE É O CAMPEÃO DO AGROTÓXICO. FAZ MAL?
Fotos Fabiano Accorsi |
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